Um fantasma que não passa dos Andes
. Messias Mendes
O termo bolivarismo é originário do sobrenome do libertador da América do Sul. Ganhou
conotação especial graças ao ex-presidente
venezuelano Hugo Chávez que, se autodenominando o novo Simón Bolívar , fundou
uma espécie de República Bolivariana no Continente. Por conta das boas relações do chavismo com os
governos petistas de Lula e Dilma, a oposição brasileira, sobretudo o PSDB,
começou a dizer que o PT está fazendo do Brasil uma Venezuela. Balivarismo , então, passou a ser considerado palavra maldita no
dicionário da casa grande.
O objetivo dessa onda antipetista é
associar o governo Dilma ao chavismo , que virou palavrão desde que Hugo Chaves
deixou a modéstia de lado e se comparou a
Simón Bolívar. Fez isso no momento em que decidiu bater de frente com a elite empresarial
venezuelana , acusada de trabalhar pela
privatização do petróleo nacional, estimulada, evidentemente, pelos dólares de grandes corporações norte-americanas.
Registre-se que os
Estados Unidos haviam crescido o olho
pra cima do Vale do Orenoco, onde se descobrira um lençol petrolífero maior que o da Arábia Saudita. A privatização da PDVSA –
Petróleos de Venezuela S.A passou a ser questão de tempo, até que no caminho
surgiu uma pedra chamada Hugo Chaves.
Com
coragem bolivariana e determinação espartana, Chaves cutucou a onça com vara curta. A tal ponto que o
grande empresariado local, liderado pelos barões da comunicação do país, se
rebelou. Em abril de 2002 tentou dar um golpe de Estado, encarcerando o
presidente da república. O golpe fracassou , porque não contavam os
golpistas que Hugo Chaves tinha ao seu
lado o povo e forças leais do exército.
De volta
ao Palácio de Miraflores, o presidente deposto ensaiou um gesto de bondade, sendo duro
mas sem perder a ternura: “ Faço um chamado aos meios de comunicação. Por Deus!
Reflitam, mas de uma vez por todas. Esse país também é de vocês (...)”.
Claro que
os barões da comunicação nem ligaram para o apelo, que julgaram falso. De nada
adiantava a tentativa de pacificação, porque o que estava por trás do frustrado
golpe eram interesses e inconfessáveis . Hugo Chaves, como se sabe, continuou
sendo hostilizado , dentro e fora da
Venezuela, ao ponto de levar uma carraspana corretiva do Rei Juan Carlo da Espanha, naquele célebre “por
que não te calas, hombre?”.
O fato concreto é que Chaves , que se aproximava cada vez
mais de Fidel Castro, virou satanás
para o poder econômico da meca do
capitalismo. Aqui no Brasil, evidentemente estimulada pelas grandes publicações
impressas e redes nacionais de TV, Globo à frente, o ódio do presidente Lula
aumentou à medida em que ele se aproximava e se solidarizava com Hugo Chaves.
A
lembrar que Chaves não foi o único a reivindicar
o personagem Simón Bolívar. O nome de Bolívar foi apropriado por um sem número
de lideranças e movimentos políticos na América Latina nos quase 200 anos que
nos separam de sua morte. Seus seguidores estão espalhados pelo continente e os efeitos das ações do Libertador parecem
eternizados pela história.
Pouco importa saber sobre o pensamento de Simón Bolívar, que liderou guerras de independência na
América do Sul, exercendo influência direta na consolidação das repúblicas da
Venezuela, Colômbia, Equador, Peru e Bolívia. Ele foi um
revolucionário, filho da
aristocracia basca, que visava a emancipação dos estados latino-americanos dos
interesses econômicos, políticos, culturais e doutrinados da Espanha. Logo, os ideais de libertação de Bolívar tinham pouca ou quase
nenhuma sintonia com o combate à pobreza da população nativa.
Sendo assim, o problema do “bolivarismo” que, por má fé ou ignorância, a elite brasileira somatiza , não é Simón Bolívar e sim o fantasma de Hugo
Chaves. E convenhamos: a alma penada de Bolívar sobrevoa o continente mas a de
Chaves não vai além da Cordilheira dos Andes.
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