* Por Alex (Folha de São Paulo)
Dizem que o jogador de futebol morre duas vezes: quando
para de jogar e quando o coração para de bater. A verdade é que meu coração
parou de bater no momento em que deixei o gramado do estádio Couto Pereira, em
Curitiba, para nunca mais atuar como profissional. Foi o abraço da minha
família que me fez senti-lo pulsar novamente, anunciando uma nova vida.
Graças ao futebol pude realizar o
sonho de toda criança e conquistar o que dificilmente conseguiria sem ele.
Nasci em um lar humilde, cresci numa comunidade e só a minha família sabe das
dificuldades por que passamos. O futebol nos salvou.
Há alguns anos as dores se
tornaram insuportáveis e fiz o que a razão e o meu corpo pediam. Entre
tratamentos e concentrações, participava de grupos de discussão e me atualizava
sobre outras óticas desse apaixonante esporte, pavimentando, quem sabe, um
futuro caminho de retorno aos gramados, só que em outra perspectiva.
De um dos grupos de discussão
nasceu o Bom Senso Futebol Clube, considerado por muitos um dos mais
significativos movimentos do nosso futebol, com várias propostas e um desejo: o
bem do futebol brasileiro. Quem disser outra coisa, ou não enxerga o cenário
atual, ou defende interesses pouco louváveis.
Cruzamos os braços, sentamos no
gramado e esperamos uma resposta da CBF e das federações. Reunimos mais de mil
atletas para reivindicar melhorias para a categoria e para salvar o futebol
brasileiro.
Milhares de garotos deixam suas
casas em busca dessa grande ilusão que é jogar futebol no Brasil, mas apenas 1
em cada 3.000 jovens consegue entrar nas categorias de base de um clube e nem
5% desses “uns” conseguem se tornar profissionais de alto nível.
No país que respira futebol
sabemos de mais e estudamos de menos. Falta competência, compromisso,
responsabilidade, paixão e visão. Os que se perpetuam no poder não têm a mínima
ideia do que fazer para promover o futebol, primeiro como importante
instrumento de educação, cidadania e transformação. Depois, como espetáculo
Confundem a seleção brasileira
com o futebol praticado no país, que está às traças. Exploram as cores da nossa
bandeira, os nossos sentimentos, mas não dão nada em troca.
Discutimos por mais de um ano com
a CBF, os clubes e o governo federal sobre a Lei de Responsabilidade Fiscal no
Esporte, cujos débitos dos clubes –que alcançam quase R$ 5 bilhões– seriam
refinanciados em 240 meses em troca de mecanismos que puniriam gestores e
instituições por descontrole de contas e irresponsabilidade na gestão.
Recentemente, a “bancada da bola”
da Câmara Federal, formada por deputados que atuam a favor de quem está no
poder do futebol, acrescentou a um projeto de lei sobre aerogeradores –assunto
que nada tem a ver com futebol– uma medida provisória para que os clubes tenham
suas dívidas fiscais refinanciadas sem contrapartida alguma.
Parcelar as dívidas dos clubes
sem contrapartidas não significa salvá-los. Uma medida como essa continua
distanciando cada vez mais o futebol brasileiro do profissionalismo e da
modernização.
O governo ainda pode anular essa
gambiarra e acredito que a presidente Dilma esteja realmente sensibilizada com
a situação do nosso futebol e possa vetar esse jogo sujo.
Ouso sonhar com um Brasil de
primeiro mundo, onde a educação, o esporte e cidadania possam ter o valor e
destaque que merecem.
*ALEXSANDRO DE SOUZA, 37, o
Alex, ex-jogador de futebol, é um dos idealizadores do Bom Senso FC, associação
dedicada a promover reformulações no esporte. Jogou em clubes como Coritiba,
Palmeiras, Cruzeiro e Fenerbahçe (Turquia), além de ter atuado pela seleção
brasileira
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