Por Leandro Fortes*, em 29/12/2017
Há algo de extremamente doentio na relação da
extrema direita com o crime de estupro, embora isso não seja, exatamente, uma
novidade.
Na horripilante alegoria do fascismo feita pelo
cineasta Paolo Pasolini, em 1975, “Saló ou 120 dias de Sodoma”, um grupo de
jovens, homens e mulheres, é sequestrado por militares fascistas para ser
brutalizado e submetido a todo tipo de sevícia sexual.
No filme, as cenas de sadismo, escatologia e
tortura são o pano de fundo para as sequências de estupro, um instrumento de
dominação presente em todas as masmorras de governos autoritários, uma arma de
guerra de todos os exércitos – um método de terror que nunca se perdeu no
tempo.
No Brasil, o uso do estupro para aterrorizar e
torturar presos políticos, sobretudo as mulheres, tornou-se um legado
patológico da ditadura militar transformado em um incontrolável desejo sexual
pelos psicopatas de direita. Ora pensado como instrumento de vingança, ora como
punição necessária aos que não rezam pela cartilha fascista.
Jair Bolsonaro, processado no Supremo Tribunal
Federal por incitação ao estupro da deputada Maria do Rosário (PT-RS), reúne em
si e em torno de seus seguidores todas as variáveis dessa patologia. Ao votar
pelo impeachment da presidenta Dilma Rousseff, Bolsonaro fez questão de
homenagear o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, a besta fera que torturava
presos políticos no DOI-CODI de São Paulo, nos anos 1970.
Lá, Ustra colocava ratos nas vaginas de mulheres e
organizava sessões de estupros para aterrorizá-las. Ato contínuo, colocava as
próprias filhas para brincar com as presas recém-seviciadas, como denunciou, no
histórico artigo “Brinquedo macabro”, o jornalista Moacir de Oliveira Filho, o
Moa.
Ustra era um demente monstruoso.
Por essa razão, não deixa de ser coerente que os
admiradores de Jair Bolsonaro, hidrófobos alimentados por uma ração permanente
de ódio, ignorância e intolerância, infestem as redes sociais para comemorar o
assalto sofrido por Maria do Rosário. E, mais ainda, demonstrar imenso
descontentamento por ela não ter sido estuprada.
Trata-se de uma matilha adestrada pela narrativa
que relaciona Direitos Humanos à defesa de bandidos. Uma deformação de
pensamento que, infelizmente, revela a precariedade da educação básica
brasileira, principalmente nessa classe média iletrada e reacionária que, hoje,
sustenta a candidatura de um idiota que comemora um assalto e torce pelo
estupro de uma mulher”.
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Leandro Fortes é jornalista, escritor
e professor universitário
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