. Por Carlos Chagas (blog do Cláudio Humberto)
Momentos de nossa História recente merecem ser lembrados,
quando nada para não se repetirem. Desde 1963 que a nação estava
dividida. De um lado o presidente João Goulart, empurrado por lideranças
sindicais e por parte de seus correligionários para a necessidade de mudanças
profundas e atabalhoadas nos planos social, econômico e político.
Além, é claro, de suas próprias inclinações, disposto a marcar seu governo como
Getulio Vargas tinha marcado o dele, por reformas capazes de beneficiar o
proletariado urbano e os assalariados, além de dotar o país de uma
infra-estrutura nacional. Só conseguiu alcançar essas metas através de um
estado unitário, dissolvendo a federação e o Congresso. Mas levou quinze anos,
sendo que Goulart, seu afilhado político, só dispunha de três, depois de
libertar-se de um parlamentarismo de ocasião. Assim, Jango estimulou
movimentos de massa, geralmente pacíficos bem como greves, que se
repetiam aos montões. Adotou restrições à remessa de lucros por parte de
companhias estrangeiras, aceitou a estatização de prestadoras de
péssimos serviços públicos e criou empresas públicas que serviriam de alternativa para as
concorrentes alienígenas, como a Central de Medicamentos, para produzir
remédios a preços populares. Empenhou-se, também, numa ampla reforma agrária em
condições de reduzir a presença do latifúndio que predominava de
Norte a Sul. Libertadas tantas forças antes divididas e até conflitantes,
vieram os excessos, também unindo quantos se opunham às chamadas reformas
de base.
Insurgiram-se o empresariado nacional e multinacional, a
Igreja e os meios de comunicação, logo
conseguindo cooptar a classe média, temerosa da presença do proletariado ao
redor do poder e servindo de trampolim para a preservação dos privilégios das
elites. Apregoava-se estar o comunismo a um passo de conquistar o Brasil, o que
era renomada mentira, mas que de tantas vezes repetida, tornou-se verdade aqui
e lá fora. Os Estados Unidos, acostumados a dominar o quintal
latino-americano, assustavam-se com a revolução cubana,dispostos a não
permitir sua repetição do lado de cá do mundo.
Rachada de alto a baixo, a sociedade especulava a respeito da
posição a ser adotada pelasforças armadas,
realmente o fator maior de decisão sobre os rumos a tomar. O presidente já
tivera problemas militares quando de sua tumultuada posse, em 1961. Depois da
iminência da guerra civil, prevaleceu o espírito legalista da maioria da
oficialidade. Jango imaginava que com a mudança nos comandos principais,
detinha o controle de um esquema sólido e fiel à sua condição de
comandante em chefe. Foi quando cedeu a mais uma pressão de seupano de fundo meio cego e meio irresponsável.
Apoiou reivindicações de marinheiros rebelados, anistiando-os, e também de
sargentos. Partiu para a implantação das reformas através de decretos,
sem a participação do Congresso, também dividido, ainda que mais
conservador do que reformista. Disposto a mudar o país através da convocação
das massas, não percebeu que já se conspirava, antes para impedir a realização
de seu programa, depois para depô-lo.
O resultado é conhecido. Quando os tanques deixaram os quartéis,
a classe média e as
elites aplaudiram, tendo os operários ficado em casa e os camponeses
continuando a trabalhar na enxada. O primeiro general-presidente,
Castello Branco, foi entoado em loas e saudado como se tivesse sido eleito.
Duas fobias, porém, envolveram o novo governo: os militares,
confundindo adversários com inimigos, exigindo do presidente medidas de
exceção e permanente caça “aos comunistas”, primeiro cassando, suspendendo
direitos políticos e censurando. Mais tarde, torturando. No reverso da mesma
medalha, as elites deitaram e rolaram, através de uma política econômica voltada para a ampliação de seus
interesses, com prevalência das multinacionais. Em poucos anos e alguns
generais o jogo virou. Primeiro os estudantes, mais tarde os operários, em
seguida a Igreja e a classe média, formou-se uma frente ampla contrária ao
regime castrense. Até uma insensata luta armada deu aos donos do poder
argumentos para nele permanecerem. Só que não agüentaram. Felizmente, tudo se
passou em etapas quase pacíficas. Mas saíram, depois de 25 anos.
Por
que se
recordam esses episódios esparsos? Para que o leitor classifique em
que etapa do processo nos encontramos hoje
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