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O dia em que vi o andarilho dar um tapa na cara da sociedade

                   

A vida reserva surpresas que a própria surpresa desconhece. Às vezes você se depara com cenas que, de tão surreais,  parecem extraídas de um filme de Buñuel. Mas não era o cineasta espanhol que estava ali na figura daquele homem alto, magro, barbudo e com andar sincopado. Era apenas um andante de rua, sem eira e nem beira, mas certamente com um coração do tamanho daquele prédio que um dia foi o Cine Maringá e hoje é um templo da Igreja Universal do reino do “deus” Edir Macedo.

Sempre que passo por ali no final da tarde, vejo aquele senhor sentado na calçada e com as costas apoiadas na banca de revistas. Com o aproximar das pessoas que ele parece imaginar terem dinheiro no bolso, estende a mão e suplica com voz rouca: “Tem aí umas moedas para eu poder comer? Tô com fome”. Raramente alguém dá, uns por alimentarem a concepção gonzagueana de que “a esmola a um homem que é são, ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão”;  outros por seguirem a recomendação dos órgãos de assistência social para não dar esmolas e outros tantos,  por avareza mesmo.

Fico com os conselhos do velho  Lua. Ou melhor, ficava, porque depois de ver aquele homem se aproximar de um paraplégico que, como ele, pedia esmola naquele quarteirão, tirar da algibeira  uma nota de R$ 5,00 e colocar na cumbuca do colega desafortunado, confesso que balancei. Claro que minha consciência segue inabalável, mas desde então coloquei nas mãos de Deus a reavaliação de alguns conceitos pessoais que hoje “varrumam” as minhas ideias.

Um deles é este de não dar esmola, para nem matar de vergonha e nem viciar o cidadão. A conclusão a que estou chegando é que em alguns casos fica difícil negar ajuda de centavos (é o que eles pedem) a quem luta desesperadamente para matar a fome. Um amigo meu sustenta que nem todos estão realmente com fome e usam o que ganham na rua para comer. Muitos comprarão droga ou, na maioria dos casos, uma garrafinha de aguardente.

Existe uma lenda (não pode ser outra coisa) de que alguns acabam fazendo seu “pé de meia” com os trocados que ganham na rua, hora sim e hora também. Para esses, valeria  a segunda parte do verso cantado por Luiz Gonzaga: “...vicia o cidadão”.

Não, não pretendo ser propagador da esmola e nem defensor desse tipo de generosidade. Enquanto cidadão brasileiro,  profissão esperança, prefiro seguir na minha cruzada de criticas à brutal concentração de renda existente (e persistente) no Brasil. E com igual indignação vendo, sem nada poder fazer, o descaso dos gestores públicos das três esferas de poder  para com os milhões  de miseráveis que perambulam  por ruas, avenidas, praças e vielas.

Prefiro, em fim, manter firmes as minhas convicções de que o neoliberalismo pupiniquim  é tão perverso quanto burro. De qualquer forma,  fica a lição do nosso personagem:  solidariedade em estado puro como a desse senhor , mais do que nos comover,   representa um tapa na cara da sociedade.

 

 


Comentários

Décio disse…
Bela reflexão Messias, assim caminha a humanidade.

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